O Mês da Bíblia teve início no
Brasil há mais de 50 anos e é uma atividade que ocorre todos os anos, com o
objetivo de estudar um tema ou um determinado livro bíblico. O Mês da Bíblia deste ano, realizado agora em
setembro, tem como tema o Livro de Josué, que foi escolhido pela CNBB com as
demais instituições bíblicas. A motivação para essa escolha foi a comemoração
do bicentenário da Independência do Brasil e o fato de este ser um ano de eleição. Esses eventos estão em sintonia com
dois dos principais temas do Livro de Josué: a terra e o papel fundamental das
lideranças.
Josué é o livro que narra a
entrada na Terra Prometida, após a libertação da escravidão no Egito e a longa
travessia pelo deserto. Esse livro não tem a pretensão de oferecer dados
históricos ou baseados na Arqueologia, mas de confirmar a presença de Deus em
toda a história.
De acordo com a irmã Zuleica Silvano, fsp, biblista do
Serviço de Animação Bíblica da Paulinas (SAB)
e uma das organizadoras da obra, o Livro de Josué teve um longo período de
redação; provavelmente, surgiu no reinado de
Josias, mas recebeu influência do período exílico e pós-exílico. O protagonista
do livro, Josué, é apresentado como um modelo de líder, servindo como paradigma
para as grandes lideranças da terra de Israel.
Por isso, é semelhante a Moisés, dado que será seu sucessor, e ao rei Josias,
considerado um rei fiel pela tradição deuteronomista.
Josué é capaz de unificar o povo,
não por causa de sua força guerreira ou de suas capacidades bélicas, mas por
confiar nas promessas de Deus e ser obediente à sua vontade. A pergunta que
perpassa esse livro, se considerarmos a sua compilação no pós-exílio, é: por
que perdemos a Terra Prometida para os assírios e babilônicos? Será que os outros
deuses são mais potentes do que o Deus de Israel? Será que Deus nos abandonou?
O autor ou os autores da tradição deuteronomista respondem de forma negativa
essas duas últimas questões e reafirmam a fidelidade divina, que cumpriu sua
promessa ao conceder a terra ao povo eleito, como prometera aos patriarcas e
matriarcas. No entanto, conforme a Aliança firmada com Deus, para permanecer na
terra, eram necessárias a fidelidade do povo e a observância aos mandamentos
por parte de suas lideranças. Infelizmente, isso não ocorreu, por isso perderam
a terra. De fato, o Livro de Josué ajuda o povo a tomar consciência de sua
infidelidade, não para ficar se lamentando, mas para retomar a Aliança, e o
anima nessa fase de reestruturação, após o
exílio babilônico.
Tudo isso está presente na obra
que lançamos: Livro de Josué – Nós serviremos ao Senhor, escrita por vários autores, biblista e professores das diversas
faculdades de Teologia do Brasil. Esse livro estrutura-se em três partes. Na
primeira, há uma introdução ao Livro de Josué,
na qual são fornecidas informações sobre quem é Josué, quando e onde esse livro
foi escrito, suas características teológicas principais, e são oferecidas
chaves de leitura, dado que a pretensão desse livro não é apresentar dados
arqueológicos ou historiográficos, como já mencionado, e sim ser uma catequese,
para fortalecer a fé do povo. Mas, se é uma catequese, como foram as origens de Israel? Para responder a essa pergunta,
dedicamos um artigo que sintetiza as várias hipóteses dessa origem, sendo ainda
uma questão aberta. A segunda parte da obra lançada por Paulinas tem como escopo
abordar teologicamente aspectos importantes presentes no Livro de Josué, como: a questão da terra; o ser povo, e não tribos isoladas; a
Teologia da Aliança e da Retribuição; a face guerreira e violenta de Deus, que
perpassa todo o Livro de Josué. Na terceira
parte, analisamos exegeticamente alguns textos mais conhecidos, como a
derrubada das muralhas de Jericó, ou seja, a narração de uma grande liturgia no
início da ocupação da Terra Prometida; o papel fundamental da cananeia Raab,
uma mulher prostituída, responsável pela sua família, que colabora na tomada da
cidade de Jericó, citada nos textos rabínicos e
elogiada no Antigo e no Novo Testamentos, sendo mencionada na genealogia de
Jesus no Evangelho segundo Mateus. Por fim, estudamos mais de perto o discurso
de despedida de Josué, nos capítulos 23 e 24, quando as tribos se reúnem e
reafirmam a Aliança com Deus.
Com tantos detalhes ou passagens, o Livro de Josué – Nós serviremos ao Senhor pode parecer uma leitura
difícil. No entanto, o livro é acessível, e os aspectos técnicos, empregados
quando necessário, são devidamente explicados nas notas de rodapé. Nosso
desejo, conforme afirma a organizadora da obra, é que todos possam estudar esse
livro pouco conhecido, mas atual, pois traz questões pertinentes para nossa
realidade, como: a problemática da distribuição da terra; a terra como dom, e não como um objeto a
ser explorado; a importância de escolher bem nossas
liderança e representantes, responsabilidade coletiva; e o perceber a presença
amorosa de Deus, que perpassa a história bíblica e também nossa vida, nossa
história.
Ir. Zuleica Silvano, fsp
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